As tartarugas

Há sempre um peso que nos acompanha. Até o vazio parece pesar. Mas seguimos, cambaleantes, sedentas, à procura de ‘mar. Quanto mais perto dele, do mar, mais leves estamos, mas…talvez seja tarde, podemos cansar. Tartarugas podem viver mais de cem anos, pessoas também. Podem. Esse verbo é uma loucura, daquelas terríveis de conjugar. Será que posso? Conjugar bala perdida, violência, burguesia assassina que mata meu povo todo dia, mata mana negra, mana índia, mata, desmata. Não há sombras no caminho. E talvez por isso ande cansada, sol na cara, na casca. Cascadura. Tenho uma amiga que está morrendo. Não parece estranho que todas estamos? Viver significa morrer um pouquinho por dia. Faz vinte e cinco anos que ando morrendo. Todavia, certa vez, numa grande convenção de tartarugas, determinou-se que daquele momento em diante, por vastos anos, se viveria um pouquinho por dia. E elas foram às ruas, as tartarugas todas nuas! Depois, deixamos de ser tartarugas e viramos isso. A humanidade me causa arrepios. Cunha existe. Minha vó também. Um dia ela chorou declamando um poema que ouvia de sua mãe quando era criança. A humanidade da minha vó me arrepia. Todavia, tenho saudade das tartarugas, de quando se buscava leveza na dureza. Havia menos insônia, e tanto mar.
Olho os livros na estante.

(Y uma pausa suspirante)

Será que há tempo para ser professora de português?

 

 

~2016



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